Onde eu estava nos anos petistas?

23/03/2019 23:13

Em tempos como os atuais, de discussões políticas sempre mais vazias e "amores cegos" por certas figuras políticas, ficam comuns lados opostos acusarem uns aos outros de "imbecis", "mimizentos" e "ignorantes". Não que algumas pessoas realmente sejam tudo isto, mas o problema é a redução da discussão política apenas a tais adjetivações. Neste contexto de "amores cegos", um lado culpa o atual governo por mazelas e "culturas" que, na verdade, são antigas, enquanto um outro lado repete ad nauseam o questionamento: "Onde você estava nos governos petistas?"

Quando Lula assumiu a presidência, em 2003, eu ainda não tinha 16 anos completos. Na época, era favorável ao PT, acreditava que o partido realmente andava por princípios de honestidade e ética. A simpatia pelo PT aumentou quando começaram a expandir programas que até hoje fazem muitos brasileiros acreditarem que o PT trabalhou pelo povo: ProUni, Bolsa Família, Fome Zero, etc. No entanto, as primeiras denúncias de envolvimento de políticos do PT em esquemas corruptos colocaram "água no chope" e me fizeram repensar toda a admiração por Lula e pelo PT.

Naquele momento, porém, minhas simpatias políticas não eram acompanhadas por leituras e estudos que dessem embasamento melhor para conversar sobre política e analisar criticamente minhas posições. A rotina de sair da zona de conforto e olhar o contexto político com olhares mais críticos começou, timidamente, a partir dos 18 anos de idade, quando a iniciante formação acadêmica universitária abriu os olhos para a necessidade de se enxergar além do senso comum e além das "paixões partidárias".

Logo vieram as primeiras oportunidades como professor e, no decorrer do tempo, ficaram frequentes as discussões políticas com colegas de trabalho, em uma dinâmica na qual, discutindo, aprendi a discutir melhor e a não ter medo de expor posições políticas que pudessem divergir com a maioria. Foi assim que passei a ser cada vez mais crítico ao PT, não disfarçando isto nem mesmo quando estava no meio de vários simpatizantes do partido ou da figura de Lula[1]. No entanto, aprendizados seriam necessários, pois não poderia, simplesmente, passar de uma simpatia inquestionável a uma "oposição a tudo que se move". É o "ser político" em constante formação!

O maior aprendizado cuja necessidade percebi foi o de encontrar um ponto de equilíbrio capaz de reconhecer méritos e deméritos, mesmo que isto significasse criticar grupos e ideias com os quais simpatizo e elogiar grupos e ideias aos quais me oponho[2]. Este ponto de equilíbrio vem sendo buscado e tal busca ocorre junto com fatos políticos relevantes nos últimos anos. Dentro deste equilíbrio buscado, passei a ser capaz de, ao mesmo tempo, reconhecer os avanços socioeconômicos da "era PT" no governo federal[3] e repudiar as contradições[4] e os crimes cometidos na mesma era (ciente, é claro, de que o PT não cometeu erros sozinho nem inventou a corrupção no Brasil); também passei a ser capaz de, ao mesmo tempo, reconhecer alguns méritos das direitas no contexto político dos últimos anos e repudiar práticas e discursos destas mesmas direitas. Isto não seria "ficar em cima do muro"? Não quando se tem um pensamento político definido! No meu caso, tenho partido e tenho uma consciência política capaz de me posicionar (na última eleição presidencial, por exemplo, o meu voto em Ciro Gomes foi um voto em quem estava mais próximo ao meu pensamento político[5]).

Nos últimos anos, as redes sociais passaram a ser cada vez mais usadas para externar pensamentos políticos[6], embora eu ainda prefira as discussões pessoais, o "olho no olho". As redes sociais são importantes meios para discussão política, embora também seja o meio que potencializou as discussões vazias e as paixões cegas por certas figuras políticas. Mesmo assim, acredito que, pelas redes, é possível debater política (seja apoiando ou se opondo ao grupo então no poder) com embasamento, seriedade e propostas, estando tudo isto, porém, em função da necessidade de sair da zona de conforto e não se fechar em "clubinhos ideológicos".

Com base em todo o exposto até aqui, é possível afirmar que, nos "anos petistas" (2003-2016), eu estava em crescimento como "ser político", um crescimento constante e cujos resultados se refletem nas práticas e discussões cotidianas.



[1] Ou nem mesmo em minha participação sindical. Sou filiado ao Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (SindUTE - Minas Gerais), defendo pautas de melhorias para os trabalhadores em educação (não somente os professores), sou crítico quanto às últimas administrações do Executivo estadual, mas não vejo com bons olhos o envolvimento sindical em pautas partidárias ligadas ao PT.

 

[5] Me chamaram a atenção as propostas de Ciro Gomes para a reforma da Previdência e os resultados de suas experiências no Legislativo e Executivo, além de boa parte das ideias do PDT. A simpatia pelo partido e pela figura de Ciro aumentaram quando os mesmos aceitaram o convite para apresentar, ao atual governo federal, suas ideias para a Previdência, mostrando que não são "oposição a tudo que se move".

 

[6] Por exemplo, críticas às esquerdas que ainda se atrelam ao PT:

https://www.facebook.com/uchoas.professor/posts/1810433529197429

 

Licença Creative Commons
 

Pesquisar no site

Contato

Intimidade com a História