Abordagem sobre mitos africanos na escola

18/10/2015 14:24

A edição número 286 da revista Nova Escola (outubro de 2015) traz uma interessante sugestão pedagógica para a Educação Infantil. A sugestão consiste na contação de histórias de origem africana e no posterior desenvolvimento de atividades que interajam as crianças com este mundo mitológico tão diversificado.

A proposta da revista é totalmente válida no sentido de abrir às crianças um mundo diferente daquilo a que elas estão acostumadas, ainda mais se considerarmos que as crianças que entram na Educação Infantil têm a família como o primeiro, principal e muitas vezes único referencial cultural, tornando a contação de histórias (não só mitos africanos, mas quaisquer histórias) uma abertura privilegiada a vários mundos culturais. Além disso, o que é proposto na revista Nova Escola vem ao encontro da lei 10639/2003 que, apesar de estabelecer o trabalho com a história e cultura africanas apenas nos Ensinos Fundamental e Médio, faz a Educação Infantil refletir e assumir também para si a responsabilidade de introduzir os alunos nos elementos formadores da sociedade e da cultura no Brasil.

No entanto, a proposta de contação de histórias africanas na Educação Infantil permite algumas considerações a respeito dos entraves para que ela aconteça com qualidade. O primeiro entrave é a formação acadêmica do professor, que muitas vezes não têm bases metodológicas, históricas e culturais satisfatórias para lidar com a diversidade cultural africana e explorá-la em sala de aula a favor da aprendizagem. Por bases metodológicas, entenda-se conhecimentos que permitam tratar de temáticas africanas de forma lúdica sem deixar de dar atenção aos estereótipos que devem ser evitados na formação da visão dos alunos sobre a África; por bases históricas e culturais, entenda-se conhecimentos básicos que um professor precisa ter ao abordar temáticas africanas (povos, crenças, contextos sociais e culturais, etc).

O segundo entrave é a formação religiosa e escolar do professor e dos alunos. Não podemos fechar os olhos para os vários casos de intolerância e os vários preconceitos em relação a elementos culturais africanos. Isso se deve, muitas vezes, a uma formação escolar onde a África é apresentada com estereótipos ou a uma formação religiosa que combate e “demoniza” o que vem da cultura africana. Os estereótipos sobre a África são formados na medida em que o aluno passa a acreditar que o continente só tem miséria e guerras e na medida em que o professor aborda o continente africano de maneira rasa sem levar em conta que a África é um continente (acredite: há alunos que crescem achando que a África é um só país) e que tem diferenças culturais e sociais imensas. Já a demonização ocorre quando rituais e tradições religiosas diferentes do que acreditamos passam a ser vistos como “obras do demônio” e como ameaças que devem ser combatidas belicamente em nome do deus que adoramos (seja ele qual for). Estes dois fenômenos (estereótipos e demonizações) constituem obstáculos imensos ao ensino de temáticas africanas na escola.

Está mais do que na hora de nossos professores, independente da formação que tiveram em vários níveis (acadêmica, religiosa, cultural, etc), abram-se às possibilidades de ensinar os alunos a enxergar e respeitar as inúmeras diversidades presentes na sociedade brasileira (não se está falando aqui em concordar, mas apenas em enxergar e respeitar), a fim de que aos poucos possamos ver uma sociedade mais tolerante, mais respeitosa e mais combativa contra as violências e intolerâncias que ainda vicejam atualmente.

 

RECOMENDAÇÃO DE LEITURA:

Revista Nova Escola, Fundação Victor Civita, ano 30, nº 286, out.2015, p. 38-40 (“Debaixo da árvore, histórias e mitos”).

 

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