Esmiuçando a PEC 55/2016

13/11/2016 11:41

O assunto do momento no Brasil é o Projeto de Emenda à Constituição número 55 (PEC 55/2016), que antes de chegar ao Senado era chamada por PEC 241/2016. Dos altos círculos políticos até as rodas de conversas nos bares, brasileiros tentam entender e discutir o polêmico projeto que, para alguns, vai "salvar" as finanças do governo federal, enquanto para outros vai sacrificar o povo brasileiro ainda mais.

Neste breve informativo, vamos entender a PEC 55 em forma de perguntas e respostas. Obviamente, o texto aqui escrito é passível de contra-argumentos, o que é positivo para um debate saudável, fundamentado em ideias e que não parte para ataques e desqualificações pessoais.

 

1. O QUE É UMA PEC?

Para simplificar, PEC é um projeto para alterar partes do texto da Constituição sem que seja necessária a convocação de uma Assembleia Constituinte. Quem pode propor emendas constitucionais são o presidente da República, as Assembleias Legislativas (há regras para que estas proponham PECs), deputados federais e senadores. Até que uma PEC seja aprovada, o seu processo inclui discussão e votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em comissão temporária criada pela CCJ e depois nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado (dois turnos de votação em cada casa legislativa)[1].

 

2. O QUE É A PEC 55?

A PEC 241/2016 é uma proposta do presidente Michel Temer (PMDB) para limitar o crescimento dos gastos públicos no Brasil. Quando aprovada na Câmara dos Deputados e encaminhada ao Senado, ganhou nova numeração, sendo agora PEC 55.

 

3. O QUE SÃO GASTOS PÚBLICOS?

Por gasto público, entende-se que seja todo gasto do Estado para custear os serviços públicos prestados à sociedade[2]. Os gastos públicos podem ser:

Correntes: despesas com pessoal, juros e encargos e outras despesas correntes, como a manutenção dos serviços públicos (saúde, educação, segurança e conservação de bens móveis e imóveis).

De capital: despesas com amortização da dívida pública, investimentos e inversões financeiras. Os investimentos são as despesas com planejamento e execução de obras públicas e aquisição de equipamentos, materiais e instalações. Já as inversões financeiras envolvem: aquisição de imóveis, aquisição de títulos de capital de empresas, constituição ou aumento do capital de empresas ou entidades comerciais ou financeiras, entre outros investimentos.

 

4. O QUE DIZ A PEC 55?

A íntegra da PEC 55 pode ser consultada por qualquer pessoa no site do Senado[3]. Vamos aqui esmiuçar detalhes do que diz a PEC 55 para depois analisar estes detalhes:

 

Artigo 1º da PEC: propõe mudanças nos artigos 101 a 109 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ou seja, da parte da Constituição que legisla sobre situações transitórias, estando estas com seu caráter jurídico extinto quando ocorre a situação prevista[4]. As tais mudanças propostas farão com que os referidos artigos assim estabeleçam:

- Artigo 101: fixa em 20 anos o novo regime fiscal.

- Artigo 102: estabelece quem será afetado pelos limites de gastos (em suma, os três poderes) e fixa como será reajustado o limite; neste caso, propõe a correção do limite de gastos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ou seja, corrige o limite dos gastos pela inflação registrada no ano anterior. Além disso, o artigo propõe também que certas ações governamentais não estarão sujeitas aos limites estabelecidos, tais como: transferência aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios de recursos decorrentes da exploração de petróleo, gás natural e outros recursos hídricos e minerais; transferência aos estados e ao Distrito Federal de recursos decorrentes da arrecadação de impostos; abertura de créditos em casos de despesas imprevisíveis e urgentes (guerras, calamidades públicas, etc); despesas da Justiça Eleitoral com a realização de eleições; despesas com aumento de capital de empresas estatais não-dependentes[5]; entre outras.

- Artigo 103: estabelece que o presidente da República só poderá propor alteração no método de correção dos limites de gastos apenas uma vez nos 20 anos de vigência do regime fiscal, e tal proposta só poderá ocorrer a partir do 10º ano da vigência do regime.

- Artigo 104: fixa punições ao Poder Executivo e outros órgãos que não cumprirem o limite de gastos: proibição de aumentos para servidores públicos e militares, de realização de concursos, de alterações em planos de carreira que acarretem aumento de despesas, de criação de cargos (exceto as reposições de cargos que não acarretem aumento de despesas), entre outras. O descumprimento dos limites também acarretaria, de acordo com a proposta, no veto a incentivos ou benefícios tributários e à criação ou expansão de linhas de financiamento, entre outros.

- Artigo 105: estabelece que as aplicações mínimas em serviços de saúde e educação devem obedecer à correção pela inflação.

- Artigo 106: submete as emendas individuais aos projetos de lei orçamentária às correções pela inflação.

- Artigos 107 a 109: estabelecem regras para conter pagamentos futuros decorrentes da PEC[6].

 

Artigos 2º e 3º da PEC: dispõem sobre a entrada em vigor da PEC (caso aprovada e promulgada) e sobre a revogação do artigo 2º da Emenda Constitucional 86, de 17 de março de 2015[7].

 

5. QUAIS OS ARGUMENTOS DE QUEM DEFENDE A PEC 55?

Os defensores da PEC 55 argumentam que o país precisa conter os gastos públicos (que vêm aumentando acima da inflação desde 1991) e que a PEC, se aprovada, vai frear estes gastos, obrigando os governantes a administrarem melhor os gastos e tornando mais eficaz a gestão fiscal. Além disso, argumenta-se também que a saúde e a educação poderão receber investimentos corrigidos acima da inflação, que a dívida pública irá diminuir graças à contenção de gastos e que a não aprovação da PEC obrigaria o governo a adotar outras formas de sanar o déficit nas contas públicas, como, por exemplo, o aumento de impostos[8].

 

6. QUAIS OS ARGUMENTOS DE QUEM É CONTRA A PEC 55?

Os que são contrários à PEC 55 argumentam que a mesma, se aprovada, não resolverá o problema fiscal no Brasil pois o diagnóstico foi feito de forma equivocada, sem considerar a forte queda da arrecadação e o aumento de gastos com o pagamento da dívida pública. Além disso, criticam o atrelamento da correção dos gastos com saúde e educação à inflação, sem levar em conta o crescimento do PIB e o crescimento demográfico brasileiro, que obrigariam a rever os reajustes nos gastos. Para os críticos, a PEC representa "estrangulamento" de gastos em saúde e educação por causa do aumento de outras despesas obrigatórias (como a Previdência). Por fim, argumentam que os gastos públicos podem ser equilibrados através de uma reforma tributária que contemple, entre outras coisas, o aumento dos impostos cobrados dos mais ricos, além de afirmarem que a PEC pode estender a crise ao dificultar o investimento público[9].

 

7. A EDUCAÇÃO CONTINUARÁ RECEBENDO GRANDES INVESTIMENTOS MESMO COM A APROVAÇÃO DA PEC 55?

De 2004 a 2014, os investimentos do governo federal em educação subiram de R$ 24,5 bilhões (2004) para 94,2 bilhões (2014), aumentando proporcionalmente mais que o PIB brasileiro[10]. Somente em 2014, o gasto com educação representou 23,14% da receita de impostos do governo, acima do estabelecido pela Constituição (18%).

Com a aprovação da PEC 55, teme-se que os investimentos em educação sofram um "estrangulamento", ou seja, que não cresçam além da inflação, o que, portanto, não representaria um aumento real nos investimentos, desconsiderando assim o crescimento populacional dos próximos anos (o que aumentaria a demanda por mais investimentos).

Em meio às discussões sobre a PEC 55, argumenta-se que a educação só pode ter melhor qualidade se estiver atrelada a investimentos[11], o que pode ficar ameaçado pelo novo regime fiscal imposto pela PEC caso seja aprovada. Também destaca-se a fala de que o impacto da PEC na limitação dos gastos públicos vai afetar inevitavelmente a educação e a saúde, prejudicando a evolução dos investimentos como vinham ocorrendo nos últimos anos[12].

 

8. A PEC LIMITA O PAGAMENTO DOS JUROS DA DÍVIDA PÚBLICA?

Como a PEC vai incidir apenas sobre as despesas primárias[13], o pagamento de juros da dívida pública não será submetido ao cálculo dos limites de gastos. Esta atitude é criticada por aqueles que se posicionam contra a PEC 55, que argumentam que o governo vai sacrificar o povo com limites de gastos mas nada fará em relação aos que se beneficiam do pagamento da dívida pública.

 

9. O QUE O GOVERNO DEVERIA FAZER EM RELAÇÃO À DÍVIDA PÚBLICA?

Uma das alternativas propostas para evitar a rigidez da PEC 55 é a auditoria da dívida pública brasileira, seguindo os exemplos do Equador, que com uma auditoria descobriu pelo menos 30 anos de irregularidades nos empréstimos e nos pagamentos de juros da dívida, e de outros países latino-americanos que estão investigando suas dívidas atrás de ilegalidades[14].

Há também um exemplo brasileiro, quando Getúlio Vargas decretou, em 1931, uma auditoria que descobriu irregularidades em 60% da dívida brasileira (ausência de contabilidade regular e de controle das remessas feitas ao exterior, falta de documentação consistente que comprovasse a dívida, entre outras). A auditoria feita no período varguista possibilitou a redução da dívida e do fluxo de pagamentos, aumentando os recursos que permitiram ao governo investir na industrialização do Brasil e nos direitos sociais[15].

A Constituição brasileira de 1988 prevê uma auditoria da dívida pública (Artigo 26 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), no entanto esta não foi feita até hoje (recentemente, a ex-presidente Dilma Rousseff vetou a auditoria como proposta para o Plano Plurianual 2016-2019).

 

10. OUTROS PAÍSES TÊM LIMITES DE GASTOS?

Diversos países ao redor do mundo têm limites de gastos públicos, no entanto a maioria sem a mesma rigidez proposta pela PEC 55. Citar estes países e suas práticas não intenciona o mero discurso de "vamos copiar o que vem de fora". Na verdade, mencionar estes países é uma forma de responder àqueles que evocam as experiências estrangeiras de tetos de gastos como forma de legitimar ou justificar a PEC na forma como está sendo discutida e votada no Brasil. A seguir, exemplos de alguns países que limitam seus gastos[16]:

Holanda: adota tetos de gastos desde 1994, sendo estes tetos válidos normalmente para períodos de quatro anos e abrangendo também o pagamento da dívida pública. Os planejamentos de tetos do governo holandês permitem aumentos nos gastos após a previsão inicial, se comprovada a existência de recursos para isto. Além disso, em 2009 e 2010 o governo holandês excluiu do teto de gastos as despesas com benefícios sociais e programas de assistência e desemprego, a fim de conter os efeitos da crise econômica de 2008. Esta flexibilidade não é prevista na PEC votada aqui no Brasil.

Suécia: adotou programas para tetos de gastos que não permitem alterações, mas que vigoram por apenas três anos (e não em 20, como é a proposta brasileira).

Finlândia: o modelo finlandês é semelhante à proposta brasileira quanto a não inclusão do pagamento da dívida pública como parte do teto de gastos, mas difere quanto ao tempo em vigor: quatro anos, permitindo alterações para flexibilizar os limites.

Dinamarca: limitou o crescimento real (acima da inflação) dos gastos a 0,5% (1994), elevando o índice para 1% entre 2002 e 2005. Atualmente, o Parlamento dinamarquês estabelece os limites de gastos a cada quatro anos.

Japão: proibiu aumentos nos gastos federais de um ano para o outro, exceto o pagamento da dívida pública.

Kosovo: o país tem programas de tetos de gastos abrangendo apenas os municípios.

Bulgária: o governo búlgaro sancionou, em 2012, lei que proíbe que as despesas ultrapassem 40% do PIB.

Apesar do exemplo de outros países ter sido defendido como modelo para o Brasil por supostamente terem dado certo e recuperado a economia dos que adotaram tetos nos gastos, a realidade é que países europeus, mesmo adotando tetos nos gastos, sofreram com os efeitos da crise de 2008, como nos casos de Holanda, Suécia e Finlândia, que tiveram altas no nível de desemprego e no valor da dívida pública.

 

11. HÁ SOLUÇÕES QUE EVITARIAM A PEC 55?

A PEC 55 apresenta problema quando fixa um regime fiscal para os próximos 20 anos (podendo ter alterações negociadas somente após o 10º ano de vigência), além de ser polêmica ao limitar despesas primárias sem considerar outras possibilidades para sanar o déficit nas contas do governo. No entanto, que soluções ou alternativas podem ser oferecidas para evitar a PEC 55? Abaixo, vamos elencar algumas possíveis soluções:

11.1. Uma proposta de teto de gastos mais flexível: estudar o que deu certo e o que não deu em propostas e práticas de outros países é um dos caminhos para se repensar uma nova proposta que limite os gastos públicos sem a rigidez temporal e sem o caráter praticamente punitivo que aperta os gastos principalmente naquilo que atinge mais diretamente o povo (as despesas primárias).

11.2. Auditoria da dívida pública: cortar gastos para continuar pagando uma dívida da qual não se sabe até que ponto é irregular ou manipulada é um ato imoral contra o povo brasileiro. A auditoria demonstra compromisso com a Constituição brasileira, com o povo brasileiro e com o dinheiro público, além de dar uma resposta histórica à necessidade que o governo tem de ser mais transparente com as suas despesas no pagamento da dívida.

11.3. Taxação das grandes fortunas: prevista na Constituição (artigo 153, inciso VII), mas ainda não regulamentada no Brasil. O Projeto de Lei do Senado número 534 (PLS 534/2011)[17] propõe que sejam consideradas grandes fortunas aquelas superiores a R$ 2,5 milhões de reais, sendo passíveis de taxações de acordo com o tamanho da fortuna. O PLS fixa critérios para quem deve ou não ser taxado, prevendo alíquotas de 0,5% a 2,5% sobre o patrimônio, de acordo com seu valor total.

 

12. A PEC 55 É INCONSTITUCIONAL?

Segundo relatório do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa[18], a PEC 55 é inconstitucional por ferir cláusulas pétreas da Constituição[19]. A seguir, uma síntese dos aspectos da PEC que ferem as cláusulas pétreas da Constituição:

 

12.1. Violação da separação dos poderes:

Ao controlar a autonomia financeira dos poderes Legislativo e Judiciário, a PEC 55 fere o princípio da separação dos poderes, congelando despesas primárias destes poderes pelos próximos 20 anos e gerando, futuramente, um sucateamento ainda maior de serviços prestados à população, como a Defensoria Pública e o Ministério Público. Além disso, abrir discussões sobre o novo regime fiscal somente a partir do 10º ano de sua vigência tira dos poderes Legislativo e Judiciário a autonomia para discutir seus orçamentos, ferindo suas autonomias administrativa e financeira. Isso sem contar que esta abertura de discussões somente no 10º ano do novo regime fiscal implica em limitação à autonomia do próprio Poder Executivo que propôs a PEC, visto que ao Executivo só se permitirá a alteração do novo regime fiscal, mediante lei complementar, apenas uma vez.

No caso do poder Legislativo, ainda há o fato de que o parágrafo 4º do artigo 104 da PEC 55 quer estender as vedações o artigo às proposições legislativas, ou seja, quer limitar o Legislativo para que não proponha leis que fujam ao novo regime fiscal. Este parágrafo, de acordo com o relatório, é inconstitucional porque fere o princípio pelo qual cada parlamentar tem autonomia na proposição de leis, mesmo que sejam inconstitucionais (a inconstitucionalidade da lei proposta só é analisada e declarada pelo Supremo Tribunal Federal, após a proposição da lei).

 

12.2. Violação à segurança jurídica:

O relatório da Consultoria Legislativa argumenta que o tempo previsto para o novo regime fiscal (20 anos) é longo demais para ser aprovado com base apenas na situação atual do país, sem levar em conta as possibilidades de futuro crescimento econômico do Brasil e de aumento das demandas sociais. Basear os limites dos gastos públicos levando em consideração as despesas de 2016 poderá prejudicar o oferecimento de serviços públicos dignos à população, e mais cedo ou mais tarde o Supremo Tribunal Federal teria de se manifestar para garantir o acesso da população aos direitos sociais fundamentais elencados na Constituição.

 

12.3. Violação à razoabilidade:

Nesta parte do relatório, questiona-se a respeito da PEC se realmente é uma medida adequada para obter um resultado pretendido, se realmente é indispensável e não pode ser substituída por outra proposta igualmente eficaz e menos danosa e se realmente não impõe sobrecarga aos atingidos por sua abrangência.

O mesmo relatório estabelece que a PEC 55 é inconstitucional quanto ao primeiro questionamento pois visa apenas a contenção do aumento de despesas, mesmo sabendo que a crise no Brasil teve importante participação do crescimento menor de receitas; também é inconstitucional quanto ao segundo questionamento pois pode ser substituída por outras propostas igualmente eficazes, como a maior tributação dos mais ricos e o fim das desonerações fiscais ainda em vigor; e também é inconstitucional quanto ao terceiro questionamento pois congela despesas que são essenciais para a população ter acesso a serviços públicos de qualidade.

 

12.4. Violação ao voto direto, secreto, universal e periódico:

Ao fixar o novo regime fiscal com duração de 20 anos, podendo haver apenas uma alteração a partir do 10º ano de vigência, a PEC limita a autonomia do presidente da República para definir o limite de despesas do seu governo, impedindo-o, assim, de exercer plenamente o mandato que lhe foi confiado pelo povo através do voto. Portanto, o voto popular (com seus aspectos direto, secreto, universal e periódico) é desrespeitado pela PEC quando esta tira dos poderes Executivo e Legislativo a autonomia para debater o teto de gastos sempre que for necessário e oportuno.

 

12.5. Violação da intranscendência da pena em sua dimensão institucional:

O título desta seção significa que a PEC estabelece, para o descumprimento dos limites, punições que são inconstitucionais por ferir a individualização da pena. Por exemplo: pelo proposto na PEC, se o Supremo Tribunal Federal ultrapassar seu teto de despesas, juízes federais de primeira instância seriam também punidos quanto a plano de carreira, aumento salarial, etc., visto que a PEC prevê que as punições se estendam ao conjunto dos órgãos referidos no artigo em que se fala destas punições.

 

12.6. Violação à vedação ao retrocesso social:

É inconstitucional permitir meios que causem retrocessos sociais no Brasil. A PEC 55, ao estabelecer as regras para aplicação de recursos na educação e na saúde, fere o princípio constitucional de vedar o retrocesso social.

Os investimentos em saúde e educação são estabelecidos na Constituição ligados a um percentual mínimo das receitas correntes (saúde) e das receitas de impostos (educação). No entanto, a PEC propõe investir em saúde e educação mediante atualização monetária (ou seja, corrigir pela inflação) dos recursos investidos em 2017. Esta base de cálculo, a médio ou longo prazo, colocará o mínimo de investimentos em educação e saúde abaixo da porcentagem fixada pela Constituição. Ciente disto, o poder Executivo propõe, na PEC 55, que seja revogada a Emenda Constitucional 86/2015 (ver nota de rodapé número 7 neste texto), justamente para ficar desobrigado de investir na saúde o mínimo de 15% das receitas correntes líquidas.

No caso específico da educação, há que se mencionar que a base de cálculo dos limites de gastos proposta pela PEC bate de frente com as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação[20] (2014-2024). Uma das metas do Plano é chegar a 2024 com o governo investindo 10% do PIB em educação pública. No entanto, com o cálculo do investimento sendo feito com base nas aplicações mínimas corrigidas pela inflação, torna-se muito mais difícil (para não dizer impossível) atingir a meta do Plano Nacional de Educação quanto a investimentos governamentais proporcionais ao PIB.

 



[1] POLITIZE. Você sabe o que é uma PEC? Disponível em: <https://www.politize.com.br/voce-sabe-o-que-e-uma-pec/> Acesso em: 09 nov.2016.

 

[2] SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA DE SANTA CATARINA. Gasto público. Disponível em: <https://www.sef.sc.gov.br/transparencia/gasto-p%C3%BAblico> Acesso em: 09 nov.2016.

 

[3] SENADO. Proposta de Emenda à Constituição nº 55, de 2016 - PEC do teto dos gastos públicos. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/127337> Acesso em: 31 out.2016.

 

[4] DIREITONET. Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/dicionario/exibir/1215/Ato-das-Disposicoes-Constitucionais-Transitorias-ADCT> Acesso em: 09 nov.2016.

[5] Empresas estatais não dependentes são aquelas empresas do governo (federal, estadual ou municipal) que não recebem do seu controlador (União, Estado ou Município) recursos para pagamento de pessoal ou de custeio.  Neste grupo aparecem, por exemplo, o Banco do Brasil, a Petrobras, a Caixa Econômica Federal, etc.

FONTES:

<https://www.planejamento.gov.br/servicos/faq/governanca-das-empresas-estatais/visao-geral-das-empresas-estatais/o-que-e-empresa-estatal-dependente>

<https://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/dest/empresas_estatais/160225_empresas-com-orc-de-invest-por-grupo.pdf>

 

[6] ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE DEFESA DOS DIREITOS DOS IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (AMPID). Entidades emitem nota técnica sobre inconstitucionalidade do congelamento dos pisos da saúde e da educação na PEC 241. Disponível em: <https://www.ampid.org.br/v1/?p=2364> Acesso em: 09 nov.2016. Publicado em: 13 out.2016.

 

[7] A Emenda Constitucional 86/2015, em seu artigo 2º, estabelece alteração no inciso I do parágrafo 2º do artigo 198 da Constituição Federal, passando a fixar em 15% da receita corrente líquida da União o mínimo para se investir em saúde. Por receita corrente líquida entende-se o total das receitas tributárias do governo, deduzidos os valores das transferências constitucionais.

FONTES:

<https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/53635.html>

<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc86.htm>

 

[8] GAZETA ONLINE. Você conhece a PEC 241? Veja argumentos contra e a favor da polêmica proposta. Disponível em: <https://www.gazetaonline.com.br/_conteudo/2016/10/noticias/economia/3989439-voce-conhece-a-pec-241-veja-argumentos-contra-e-a-favor-da-polemica-proposta.html> Acesso em: 09 nov.2016. Publicado em: 26 out.2016.

 

[9] Ver nota 8.

 

[10] MENDES, Marcos. A despesa federal em educação: 2004-2014. Boletim Legislativo nº 26, 2015. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/boletins-legislativos/bol26> Acesso em: 09 nov.2016.

 

[11] VIEIRA, Sérgio. Impacto da PEC dos Gastos na educação domina debate na CE. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/noticias/materias/2016/10/19/impacto-da-pec-dos-gastos-na-educacao-domina-debate-na-ce> Acesso em: 09 nov.2016. Publicado em: 19 out.2016.

 

[12] AGÊNCIA SENADO. Em audiência na CDH convidados apontam perdas para saúde e educação com PEC dos Gastos. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/videos/2016/10/debatedores-na-cdh-ressaltam-perdas-para-saude-e-educacao-com-pec-dos-gastos> Acesso em: 09 nov.2016. Publicado em: 31 out.2016.

 

[13] "Despesa primária é aquela em que o governo não considera os efeitos financeiros, decorrentes dos juros. Portanto, é a primeira despesa do governo, aquela que ele dispõe para executar suas políticas públicas. Ao dispor de um empréstimo bancário, ele arrecada uma receita, mas terá dois encargos: o saldo principal a amortizar e os juros. Essa despesa com juros nós denominados de nominal, e não entra no cálculo do resultado primário."

FONTE: <https://gnetoconcurseiro.blogspot.com.br/2010/10/o-que-e-uma-despesa-primaria.html>

 

[14] FATTORELLI, Maria Lúcia. Investigar a dívida pública. Disponível em: <https://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=317> Acesso em: 09 nov.2016. Publicado em: 05 fev.2009.

 

[15] Para saber mais sobre a auditoria feita no governo Vargas, leia a breve explanação que escrevi:

GUIMARÃES, Gustavo Uchôas. Lições do passado: a auditoria varguista. Disponível em: <https://em-intimidade-com-a-historia.webnode.com/news/licoes-do-passado-a-auditoria-varguista/> Publicado em: 09 out.2016.

 

[16] MEDEIROS, Étore. Nenhum país adotou o teto de gastos como o da PEC 241. Disponível em: <https://apublica.org/2016/10/truco-nenhum-pais-adotou-teto-de-gastos-como-o-da-pec-241/> Acesso em: 28 out.2016. Publicado em: 25 out.2016.

 

[17] Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/mateweb/arquivos/mate-pdf/95456.pdf>

 

[18] VIEIRA JÚNIOR, Ronaldo Jorge Araújo. As inconstitucionalidades do "novo regime fiscal" instituído pela PEC nº 55, de 2016 (PEC nº 241, de 2016, na Câmara dos Deputados). Boletim Legislativo, nº 53, nov.2016. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/boletins-legislativos/bol53> Acesso em: 10 nov.2016.

 

[19] Cláusulas pétreas são dispositivos da Constituição que não podem ser alterados nem mesmo mediante uma PEC. Na Constituição brasileira (artigo 60, parágrafo 4º), são cláusulas pétreas: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos poderes; e os direitos e garantias individuais.

FONTE: <https://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/clausula-petrea>

 

[20] BRASIL. Lei nº 13005, de 25 de junho de 2014. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm> Acesso em: 10 nov.2016.

 

 

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