Justiça da História

09/09/2015 19:16

É com muita preocupação que o mundo vem acompanhando a onda migratória que atinge a Europa nos últimos meses, por conta principalmente da guerra civil na Síria e das atividades terroristas do grupo Estado Islâmico. Milhares de pessoas tentam desesperadamente entrar em vários países europeus. Só para 2015, estão previstos 800 mil pedidos de entrada em países da Europa (quatro vezes mais que o ano passado). Além disto, cenas tristes marcam os noticiários do mundo todo, como a da criança síria que apareceu morta em uma praia turca após sua família, sem sucesso, tentar atravessar o Mediterrâneo para entrar na ilha de Cós (Grécia). Se pensarmos, porém, que esta onda tem origens distantes na História, veremos que esta vem fazendo justiça de forma triste, fazendo voltar aos europeus, séculos depois, consequências de atos passados.

No final do século XIX, a Conferência de Berlim dividiu o continente africano entre vários países europeus. França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Alemanha, Itália e Bélgica teriam grandes extensões de terras e a tarefa de garantir a manutenção de seus domínios territoriais. No início do século XX, esta sanha de domínio se estendeu ao Oriente Médio, em especial com França e Inglaterra tomando posse da maior parte do antigo Império Turco. Tanto no caso africano quanto no médio-oriental, “territórios artificiais” sem coesão nacional foram criados, muitas vezes colocando em um mesmo território grupos rivais (caso, por exemplo, dos hutus e tutsis em Ruanda, na África) ou deixando um mesmo grupo disperso em vários territórios (caso dos curdos, que até hoje se dividem entre a Síria, o Iraque e a Turquia).

A exploração do Oriente Médio e sua divisão autoritária por potências europeias agora se voltam contra os europeus, várias décadas depois, na pessoa dos imigrantes que têm de escolher entre sucumbir nas mãos de guerrilheiros e terroristas ou correr risco de morte nas águas mediterrâneas. Estes imigrantes são vítimas de anos de maus governos e de tensões políticas e religiosas que muitas vezes são frutos da colonização que formou os “territórios artificiais” (ou seja, diferente de vários outros territórios que se formaram em longos processos de formação nacional) e depois deixou estes territórios a mercê de ditadores e grupos rivais que digladiam pelo poder e fazem morrer milhares de civis inocentes.

Infelizmente, não são somente as potências europeias do passado que pagam este preço da colonização. Países como Grécia, Hungria e Sérvia também sofrem com a onda migratória e a pressão para aceitarem um número cada vez maior de médio-orientais fugitivos de suas desgraças. No entanto, a justiça da História nem sempre é justa como imaginaríamos que devesse ser. Agora, cabe às atuais potências europeias buscar meios que apaziguem os ânimos da onda migratória e sanem ao máximo o problema, pagando assim algumas dívidas do passado.

 

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