Sobre bundas, melgaços e idiotas úteis

14/02/2015 02:33

De tempos em tempos (e ultimamente vem ocorrendo com cada vez mais frequência), aparecem assuntos no Brasil que mobilizam a população, fazem parte das discussões de mesas de bar e entretêm as massas. Estes assuntos vão desde “quem matou Odete Roitman” até “quem será o próximo eliminado no BBB”. Enquanto isto, assuntos importantes que afetam a vida dos brasileiros andam a passos lentos por falta de boa vontade política, de mobilização popular e de acompanhamento daqueles que elegem os representantes no poder.

No presente momento, entre os assuntos que mobilizam a população (em especial os internautas) temos os “atributos traseiros” de Paolla Oliveira, a verdadeira identidade de Fabrício Melgaço (novela “Império”), a corrupção na Petrobrás e a crise hídrica. Apesar dos dois primeiros assuntos (ligados ao entretenimento) serem totalmente diferentes dos dois últimos (ligados a atual situação do país), todos estes primam por uma característica essencial de vários assuntos da cena brasileira: desviar o foco do que realmente importa.

Oras, mas então a crise hídrica pouco importa? A corrupção na Petrobrás não importa a este que vos escreve? Sim, os fatos importam, porém a abordagem destes fatos, em especial na internet, desvia o olhar do brasileiro de questões realmente essenciais para discussões. A crise hídrica e a corrupção na Petrobrás estão servindo para cada vez mais ataques intensos entre militantes da situação e militantes da oposição, com tudo aquilo que caracteriza a maior parte das discussões políticas nas redes sociais: desinformação, parcialidade, descompromisso com a veracidade dos fatos, manipulação de fatos e ideias em nome de interesses escusos.

São poucos (para não dizer raros) os militantes políticos que, através das redes sociais, fazem análises e discussões realmente sensatas, equilibradas, comprometidas com uma politização honesta e com uma discussão que acrescente ao invés de prestar desserviços. Pelo contrário, o que mais se vê é o uso dos fatos em evidência para inúmeras acusações e discussões que chegam a atentar contra os princípios democráticos (por exemplo, os pedidos para que os militares voltem a instalar uma ditadura no Brasil).

Esta massa de internautas acusadores muitas vezes desconhece as profundidades dos fatos que eles discutem e acabam sendo meros reprodutores de ideias que uma minoria concebeu para desestabilizar o país. E enquanto estes reprodutores (ou “idiotas úteis”) “dão à luz” mil acusações e não se preocupam com a veracidade do que dizem, projetos importantes ficam parados no Congresso Nacional à mercê da inércia da classe política. A energia e a “paixão” utilizadas para reproduzirem e discutirem todo tipo de assunto que ataque o oponente político sem debater ideias deveriam ser utilizadas para cobrarem dos nossos representantes a importância e a agilidade não dadas a temas como: reformas política, tributária e agrária, questões ambiental e indígena, estruturações da mobilidade urbana, entre outros.

Mas o que se vê é um desconhecimento ou distorção destas questões da parte de militantes que espalham manipulação e inverdades pelas redes sociais e também da parte de quem simplesmente não discute política sob nenhum ponto de vista e coloca futilidades como prioridades, pois discutir o tamanho da bunda de Paolla Oliveira não incomoda, não compromete nem gera reflexão. Afinal, por que se incomodar em estudar e buscar informações sobre as reais urgências do país se Fabrício Melgaço ainda não se revelou?

E depois que as massas se esquecerem da bunda de Paolla e da identidade de Melgaço, certamente outros assuntos surgirão para alienar os desavisados que se gabam por não discutir ou por não gostar de política, como também surgirão assuntos políticos que, ao invés de serem debatidos em sua essência, apenas alimentarão a guerra dos “idiotas úteis” contra seus oponentes.

 

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